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Aprendiz de Teologia e Filosofia

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Pensando a esquizofrenia sagrada : Pode Deus enviar um espírito malígno?


Outro dia ouvi uma pessoa afirmando que o espírito de Deus a derrubou. Pode Deus, por seu espírito derrubar ou levantar?  Pode Ele fazer o mal a um humano? Existem seitas que ensinam que Deus envia 'como castigo' uma doença, uma dificuldade e o mal. O texto de texto de 1 Samuel 16: 13-23 apresenta ao leitor algumas dificuldades de interpretação devido alguns termos nele contido. A principal destas dificuldades está na frase: “o espírito maligno, da parte do Senhor”.

Como entender este texto tão complexo, conforme diz em seus dois principais versículos: “O espírito de Iahweh tinha se retirado de Saul, e um mau espírito, procedente de Iahweh, o atormentava. Então, os servos de Saul lhe disseram: “Eis que um mau espírito vindo de Deus te atormenta (I Sm 16:14-15)?

A análise da frase  D¡ED¥I-¢GhX (Espírito de Yahweh) leva a um entendimento quando estudada dentro da frase: “o Espírito do  Senhor se retirou de Saul” (BÍBLIA,  2002, p. 412-413),que está expressa no versículo 14 do texto, pois alguns comentaristas consultados comentam a frase em sua inteireza. Champlin, citando o Dr. Ellicott, diz que:

O efeito da decida do Espírito do Senhor sobre Davi foi que o jovem pastor cresceu para tornar-se um herói, um estadista, um erudito, um sábio, um rei de profunda visão. (CHAMPLIN, 2001, p. 1180)

Para Champlin, seria “uma unção espiritual” (CHAMPLIN, 2001, p. 1180), um apontamento da parte de Deus para Davi, uma espécie de autenticação divina, como diz Eugene Merrill:

Essa era a autenticação sobrenatural da vontade de Deus. Posteriormente Davi foi ungido rei de Judá (II Sam 2.4) e, mais tarde ainda, de todo o Israel (II Sam 5.3). (MERRILL, apud, CHAMPLIN, 2001, p. 1180)

O Espírito de Deus estava em Davi. Logo, este Espírito viria a “capacitá-lo para a missão” (CHAMPLIN, 2001, p. 1180). Esse Espírito tinha particularidade de atuação no Antigo Testamento, como observa o Novo Comentário Bíblico do Antigo Testamento:

Em hebraico, a locução se apoderou significa apressou-se sobre. Foi dado a Davi o poder pelo Espírito Santo, para a função de liderar o povo de Deus, da mesma forma que havia dado a Saul (1 Sm 10.10) [...] Ao que tudo indica, o ministério do Espírito Santo foi seletivo e temporário na vida dos fiéis do Antigo Testamento.(RADMACHER [org.], 2010, p. 480)

Porém temos outra frase, a saber: D¡R¡X-¢GhX (espírito mau) que tem a uma dieferença peculiar. Olhando o texto hebraico verifica-se que este termo é diferente do anterior - D¡ED¥I-¢GhX, e, não traz o tetragrama sagrado. Finis Dake, autor da ala pentecostal, observa equivocadamente que o termo “espírito mau” seria um demônio:

O Espírito do Senhor se retirou de Saul e um demônio o possui (DAKE, apud, BÍBLIA DAKE, 2009, p. 499)

Ainda falando sobre o termo “espírito mau”, Dake salienta que, a possessão demoníaca de Saul é resultado de uma possível perca do Espírito Santo:

[...] Isto evidencia novamente que alguém que volta a pecar pode perder o Espírito Santo [...] Lúcifer, anjos caídos, demônios, Adão e Eva e muitos outros são exemplos de que o pecado pode fazer com que alguém perca aquilo que foi dado pelo Senhor.DAKE, apud, BIBLIA DAKE, 2009, p. 528)

Não podemos concordar com tal afirmação. Mesmo que no caso, seja um espírito mau, um demônio, o mesmo não foi enviado por Deus, no sentido de ter o demônio uma missão emitida pelo Senhor, mas que por ser todo-poderoso, Deus na sua permissibilidade, o emite a própria ação de impedir tal influência:

Então um mau espírito (sob o controle de Yahweh, a causa de todas as coisas) anulou todo o bem que havia nele, substituindo-o pelo mal [...] A teologia judaica era débil quanto a causas secundárias. Assim sendo, todas as coisas eram conferidas a Deus, incluindo fatores que hoje dificilmente atribuiríamos a Deus [...] Diríamos que as condições deterioradas de Saul permitiram que o mau espírito assumisse o controle de sua vida, e Yahweh estabeleceu a lei da colheita segundo a semeadura, que transformou isso em realidade. (CHAMPLIN, 2001, p. 1181)

Nos comentários da Bíblia Anotada percebe-se que o Dr. Charles Ryrie concorda com a tese de Champlin, acrescentando que houve um juízo da parte de Deus:

O espírito maligno foi usado por Deus como um instrumento de juízo sobre Saul, resultando em um distúrbio mental que beirava a loucura [...] Algo permitido pelo controle absoluto de Deus.(RYRIE, apud, BIBLIA ANOTADA E EXPANDIDA, 2007, p. 281)
 
Também Ryrie equivoca-se, não se pode atribuir faculdades a Deus por intermédio do mal. Ele não usa nada do mal, pois feriria toda teologia bíblica. O pensamento pentecostal, na sua totalidade, como Saul ouvem e vem coisas que ao homem é inconcebível. Trata-se de uma esquizofrenia sagrada. O espírito mau, no texto, é retirado não em nome de Deus por Davi, mas através de uma terapia muito utilizada hoje: a música. Basta visitar uma clínica psiquiátrica para averiguar os fatos. Pessoas pertubardas que com um remédio de 30 reais manda o 'mal' embora.

A Bíblia de Jerusalém traz um comentário sobre o termo “mau espírito”, comentado por Jorge Cesar Mota:

 Havendo o espírito de Iahweh (cf. Jz 3.10+) abandonado Saul (15.23), este é “possuído” por um  mau espírito. Diz-se que ele vem de Iahweh e será chamado “espírito mau de Deus” (vv. 15 e 16; cf. 18.10; 19.9), porque o israelita atribui tudo a Deus como causa primeira. (BÍBLIA DE JERUSALÉM, 2002, p. 412)

O Novo Comentário Bíblico do Antigo Testamento, informa que, até hoje os teólogos divergem em opinião, no que se refere a frase “um espírito mau da parte do Senhor”:

Essa informação foi interpretada de várias maneiras no decorrer do tempo: (1) possessão demoníaca como punição divina; (2) ataque ou influência demoníaca; (3) ação de um mensageiro do mal, como aquele enviado para incitar Acabe (1 Rs 22.20-23); (4) um espírito de descontentamento colocado por Deus no coração de Saul. (RADMACHER [org.], 2010, pp. 480-481)
                  
Segundo Champlin, “a teologia judaica era débil” para coisas “secundárias”. Desta forma a doença mental de Saul era aferida a Deus. Observe o comentário de Champlin:

O espírito maligno vinha da parte “de Deus”, conforme vemos nos vs. 14 deste capítulo, cujos comentários tratam de como coisas más eram atribuídas a Yahweh. A teologia dos hebreus era fraca sobre causas secundárias. (CHAMPLIN, 2001, p. 1182)

Com base na idéia teológica judaica, pode-se aferir que essa atribuição dada a Deus, com respeito também as coisas mas, seria uma espécie de supertição ou costume. A expressão “espírito mau da parte de Deus”, deve ser entendido como uma falta de entendimento da parte do autor em alocar corretamente a vontade de Deus na vida do povo de Israel. Para o hebreu, tudo o que acontecia na vida de uma pessoa era uma ação de Deus. Até mesmo as coisas relacionadas ao mau. A questão é: pode Deus enviar um espírito mau a uma pessoa? A resposta é não.

Deus não pode enviar um espírito mau para uma pessoa porque isso não combina com seu caráter moral. A moralidade de Deus neste caso é expressa no seu amor pela sua criatura. Saul estava com uma espécie de enfermidade emocional ou psicológica, resultado de sua desobediência, e estando neste estado mau, sua vida apenas encontrava conforto na musicoterapia. Precisamos enviar nossos doentes aos médicos e parar de ver espíritos malígnos em pessoas que não passam de doentes esquizofrenicos que merecem o nosso respeito e solidariedade, para não repetir o erro judáico de atribuir tudo que é secundário de responsabilidade humana a Deus.

 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BÍBLIA. VT. I Samuel. Bíblia Hebraica Stuttgartensia. 5ª ed. Ediderunt Hans Peter Rüger ET J. Ziegler. Textum Masoreticum curative. Deurche Bibelgesellschaft: Sociedade Bíblica do Brasil, 1997.

BÍBLIA. VT. I Samuel. Bíblia de Estudo Dake: Anotações, Esboços e Referências. Tradução de João Ferreira de Almeida Revista e Corrigida. Belo Horizonte: Editora Atos; Rio de Janeiro: CPAD, 2009.

BÍBLIA. VT. I Samuel. A Bíblia Anotada e Expandida Revista e Atualizada. Tradução de João Ferreira de Almeida. 2ª ed. São Paulo: Mundo Cristão; Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2007.

BÍBLIA. VT. I Samuel. Bíblia de Jerusalém. Tradução de Calisto Vendrame. São Paulo: Editora Paulus, 2002.

CHAMPLIN, Russell Norman. O Antigo Testamento interpretado versículo por versículo. 2ª ed. São Paulo: Editora Hagnos. Vol 2, 2001.

DAVIDSON, Francis (Org). O Novo Comentário da Bíblia. 3ª ed. Tradução de  Antônio J. Fernandes, Isabel Freire Messias, Jorge A. P. Rosa e João Bentes. São Paulo: Editora Vida Nova, 1997.

 NORMATIZAÇÃO E APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS CIENTÍFICOS E ACADÊMICOS. Vitória, ES: UFES/Biblioteca Central, 2006.

RADMACHER, Earl (org.). O Novo Comentário Bíblico do Antigo Testamento: A palavra de Deus ao alcance de todos. Trad. Bruno Destefani, Eduardo M. Oliveira e outros. Rio de Janeiro: Editora Central Gospel, 2010.